Há uma série expressões curiosas que eu frequentemente
repito e que causa estranheza em pessoas de fora da Bahia e do Nordeste. Ultimamente
uma delas tem me sido frequentemente cobrada, e por isso vou deter alguns
minutos divagando a respeito.
De hoje a oito.
Para a maior parte das pessoas, esta expressão é mais do que
estranha; é totalmente sem sentido. A alegação, muito simples, é bastante incômoda:
quando nos referimos, os baianos, ao dia “de hoje a oito”, estamos falando do
mesmo dia que hoje, mas na próxima semana. Desta forma, se hoje é Sábado, então
“de hoje a oito” também é Sábado.
O que é estranho para muitos, já que o intervalo entre um Sábado
e outro é exatamente uma semana, e uma semana tem sete dias.
“Digam de hoje a sete!”, pedem-me alguns interlocutores.
Deixemos momentaneamente de lado o devido respeito às peculiaridades
regionais, e à linguagem coloquial. Ocorre que dizer “de hoje a oito” não é
estranho, não é um erro aritmético, não é algo que deve ser entendido como mero
regionalismo: é uma expressão absolutamente lógica!
O que os não-baianos confundem é a frase “de hoje a oito”
com uma soma. Estaríamos, segundo os não-baianos, somando oito dias ao dia de hoje. E,
sendo assim uma soma, o “de hoje a oito” de Sábado cairia num Domingo. Um erro aritmético flagrante.
Só que não é assim.
Só que não é assim.
O que escapa a muitos é que “de hoje a oito” não trata de
nenhum tipo de soma. É de uma contagem. Eu, pessoalmente, gosto de interpelar
meus interlocutores da seguinte forma: “Conte aí de um a oito!”. E, à resposta: “Um,
dois, três, ...” eu candidamente emendo: “Se você começa a contar de um a oito
pelo um, porque quer contar de hoje a oito começando por amanhã?”
De fato, se contarmos - ou enumerarmos - oito dias, a partir
de um Sábado, teremos a seguinte sequência: (1)-Sábado, (2)-Domingo, (3)-Segunda,
(4)-Terça, (5)-Quarta, (6)-Quinta, (7)-Sexta e (8)-Sábado. Ou seja, “de hoje a
oito”, sendo hoje um Sábado, cai exatamente num Sábado.
Não se trata de ignorar o fato de que a semana tem sete
dias. Trata-se de considerar isso numa contagem, que não se traduz numa mera operação aritmética.
Tanto é que, para nós baianos, se hoje é Sábado, então o Sábado
da semana subsequente à próxima é dito “de hoje a quinze”. Não tem erro; podem enumerar: o “de
hoje a quinze” de um Sábado necessariamente cai num Sábado. Não encontrarão
nenhum baiano se referindo a “de hoje a dezesseis”. O que, aí sim, seria uma má
ilação lógica e aritmética.
O “de hoje a oito” causa estranheza à primeira vista, mas um
olhar mais atento dá conta de um recurso linguístico pitoresco, inteligente, lógico
e totalmente válido ao falar; embora, sem dúvidas, se trate de uma
particularidade da linguagem regional.
Doravante, não nos refiramos mais ao de
hoje a oito entre aspas. Um dia falamos mais sobre essas peculiaridades de nosso linguajar.
Que tal de hoje a oito?